18 de dezembro de 2009
1 de novembro de 2009
31 de julho de 2009
Corto Maltese
― Ouve, amigo, não tenho nada contra corvos, mas vê se entendes, não posso andar por aí o dia todo contigo... O que dirão os outros?...
― Então, então, Corto, és mesmo tu quem fala assim? Croack... croack... Que importa o que dizem os outros? Croack... croack...
Corto Maltese, Sonho de Uma Manhã de Meados de Inverno, As Célticas, Hugo Pratt
. . .
[...] segundo a lenda, Merlim foi encerrado por Viviana nas profundezas da floresta da Brocelândia: de vez em quando, Viviana permite-lhe sair para acudir os filhos dos celtas oprimidos e em perigo. Sim, algures, na misteriosa ilha de Avalon, o rei Artur jaz adormecido, velado pela sua irmã, a fada Morgana: um dia despertará para reunir o que resta dos celtas em todo o mundo, a fim de reconstruir o grande reino com que sonhara, reino de justiça, de fraternidade, de liberdade, reino que não existe mas que há-de vir. E Corto Maltese não é outro senão o profeta anunciador de Merlim e de Artur.
Do Prefácio de Jean Markale a Corto Maltese, As Céltica, de Hugo Pratt
20 de julho de 2009
Sou de facto o Diabo
Pensamos, em geral, em termos da nossa sensibilidade, e por isso tudo se nos volve num problema do bem e do mal; há muito que eu mesmo sofro grandes calúnias por causa dessa interpretação. Parece não ter ainda ocorrido a ninguém que as relações entre as coisas ― supondo que haja coisas e relações ― são complicadas demais para que algum deus ou diabo as explique [...].
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
10 de julho de 2009
Piratas na Cinemateca
O primeiro filme foi o The Black Swan, de Henry King. Está a ser (e vai continuar, até ao fim deste mês) uma experiência interessante, revisitar as personagens (se não as mesmas, pelo menos da mesma categoria que dantes) de que gostava quando era pequeno e que ia vendo na televisão. Desde cedo me cativaram, como a muitos, decerto, estes marginais que o cinema, numa perspectiva muito romantizada, é certo (mas isso é o cinema), tratou de representar, entre toda a relevância e, creio, conformidade geográfica dos devidos e atraentes cenários.
A par disto, todo o espaço da Cinemateca de Lisboa é extremamente aprazível e bem aproveitado. Esta temporada de pirataria, que começou este mês a invadir o sítio, tem lugar na esplanada do espaço em questão, o que, com o aproximar do calor, é ideia perfeitamente conivente com a temática dos filmes (sendo que de igual modo proporcionam imagens quentes, arejadas, estivais).
O lado técnico também é favorecedor. A larga tela de projecção da esplanada da Cinemateca, que precede o filme erguendo-se lentamente e com relativa majestade de debaixo do solo, e que lembra um pouco o monólito do 2001, Odisseia no Espaço, só que branca e horizontal, é de facto um momento interessante; e outrossim o poderá ser para quem essa imagem do 2001 tenha deixado impressão, mais ainda se se fizerem o favor de evocar, por paródia, o famoso e vital tema de abertura do poema sinfónico Also Sprach Zarathustra, de Richard Strauss (ainda que sejam outras ― todavia com aquela relacionadas ― as cenas do 2001 que esse tema ilustra).
Fica assim pago, à guisa de simples anúncio, o meu tributo à bela e instrutiva Cinemateca de Lisboa, e aos Piratas de sempre!
Yo ho ho and a bottle of rum!
7 de julho de 2009
por via do espectáculo e da falsificação da vida.»
Fundada em Junho de 1979, a editora Antígona iniciou a sua actividade com a publicação do livro Declaração de Guerra às Forças Armadas e Outros Aparelhos Repressivos do Estado. Esta obra emblemática anunciava já o programa editorial que se tem vindo a concretizar, sem desvios, ao longo de 30 anos. Hoje, com cerca de 200 títulos, a Antígona mantém a sua paixão inicial pelos textos subversivos, e vai continuar, ainda por muito tempo, a empurrar as palavras contra a ordem dominante do mundo. Com um capital social de «enquanto existir dinheiro, nunca haverá bastante para todos», esta editora tem sobrevivido a todas as crises, adaptando o seu capital variável a cada momento. Refractária, resiste à acção do fogo, sem mudar de direcção. No plano da edição, foi pioneira na forma como valorizou o trabalho do tradutor, dando-lhe força de autor ao colocar o seu nome na capa dos livros, um exemplo que não tem sido seguido por outras editoras. Dos autores publicados, cerca de 150, a maioria era desconhecida do público português, dos quais destacamos: Laurence Sterne, Max Aub, Eudora Welty, Anselm Jappe, Lewis Mumford, Albert Cossery, Bartolomé de Las Casas, La Boétie, Zamiatine, Gabrielle Wittkop, Heinrich Eduard Jacob, Fonollosa, Jean Meslier, Herder, Karl Kraus, Max Stirner, Gómez de la Serna, Robert Bringhurst, Robert Michaels, Sharon Olds, Stig Dagerman, Uzodinma Iweala, Hubert Selby Jr., etc. E assim conseguimos conquistar uma minoria absoluta, que nos sustentou nos 30 anos que agora celebramos festivamente.
Luís Oliveira
21 de junho de 2009
o
dia zangado ou
porquê→?!
dia zangado ou
porquê→?!
Tu, que te esgotas em banalidade, Tu que te regozijas com as boas estradas do teu país, Tu, que te esbanjas em sonhos estanques, Tu que não andas, Tu, febril das questiúnculas do Febril dos Mandamentos, velhaco arruaceiro do desastre da Arte, embrutecimento do verbo, verborreico vazio, gérmen estéril da Desgraçada Família, Tu o de vida depauperada, dessexuado das preces, realizado na cegueira, Tu, a das pernas fechadas para honrares o Pai e te desprezares a Ti, Tu o homofóbico, Tu, ó misógino, Tu que fazes mofa não vendo que te és escárnio em Si, Tu, que até haverias de gostar de levar no cu mas que teme-lo ainda perante a Moral talvez porque julgues que só expelir coisas dali é que é!
Tu! por que insistes em desistir de Ti se até tens com que valer, por que foges para o sonho se a Realidade é o Sonho, Tu camaleão do potencial variegado, por que te surges só monocromo, por que te resumes a embarcação unirreme de movimento circular sobre o eixo paralítico de um círculo autotelicamente irrisório e tonto em águas estagnadas e paisagem em 360º de tontaria redonda e obtusa, por que te desfazes nisso e só andas pelo país a apreciar as sáfias rectas alcatroadas?, Tu que temes as curvas não-das-estradas, que sentes vertigens não-dos-sítios-altos, mas que és efectivamente mais alto que os sítios altos, mais sinuoso que todas as curvas de todas as estradas, que tens em Ti a profundidade do pélago, a voracidade do lobo, a sageza do ofídio, diz-me Tu então!, por que te desprezas em cordeiro cagado pelo carreiro fora?!
E diz-me Tu, por que os deixas cagarem-se assim em inúteis caganitas pelo carreiro dos demais — diz-me porquê, diz-me Tu,
porquê→?!
anno 2007
10 de junho de 2009
Da Rejeição da Cegueira ou: Dali até Aqui
(old stuff)
Mora na infantilidade
Do seu ser grande.
Ser é-lhe uma futilidade,
Que da sua prisão nada se expande.
Não reconhece a vida.
Conhece-lhe só a confusão.
Sabe que a odeia (e lhe é querida),
E lhe vive o indizível, emotivo turbilhão.
«Raios! Livre é o ser invisível
Da inexistência ― nenhum!
Só esse é crível...
Porra pra esta merda, quero ser um!»
Mas um dia, ao crescer,
Veio a dizer em razão:
«Hei-de quando for grande
Ser luz do Sol
E iluminar o que escureci.»
Mora na infantilidade
Do seu ser grande.
Ser é-lhe uma futilidade,
Que da sua prisão nada se expande.
Não reconhece a vida.
Conhece-lhe só a confusão.
Sabe que a odeia (e lhe é querida),
E lhe vive o indizível, emotivo turbilhão.
«Raios! Livre é o ser invisível
Da inexistência ― nenhum!
Só esse é crível...
Porra pra esta merda, quero ser um!»
Mas um dia, ao crescer,
Veio a dizer em razão:
«Hei-de quando for grande
Ser luz do Sol
E iluminar o que escureci.»
26 de maio de 2009
Do amor...
Quero penetrar-te o ânus,
Ouvir-nos ao tom gemebundo
Do fogo que faz girar o mundo,
Entre nossos sôfregos abanos.
Quero pôr-to na boca,
Sentir-ta assim cheia,
Em tua língua de geleia,
Qual fero animal em doce toca.
Quero habitar-te a vagina,
Que é como ter-te toda,
Não apenas mera foda:
Coisa bem mais dina.
anno 2005
22 de maio de 2009
21 de maio de 2009
Para uma possível desmistificação...
20 de maio de 2009
Os olhos
nunca se fecham porque, quando se fecham (como dizemos), ficam abertos atrás das pálpebras.
3 de maio de 2009
Sou de facto o Diabo
«Mas o senhor vira tudo do avesso...»
«É o meu dever, minha senhora. Não sou, como disse Goethe, o espírito que nega, mas o espírito que contraria.»
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
27 de abril de 2009
The Ghost Song
Awake
Shake dreams from your hair
My pretty child, my sweet one.
Choose the day and choose the sign of your day
The day's divinity
First thing you see.
A vast radiant beach in a cool jeweled moon
Couples naked race down by its quiet side
And we laugh like soft, mad children
Smug in the wooly cotton brains of infancy
The music and voices are all around us.
Choose they croon the Ancient Ones
The time has come again
Choose now, they croon
Beneath the moon
Beside an ancient lake
Enter again the sweet forest
Enter the hot dream
Come with us
Everything is broken up and dances.
26 de abril de 2009
Da luz umbrífera
O ser humano é um projeccionista. Está constantemente empenhado em projectar a luz da sua capacidade de análise sobre os outros e as coisas. O que ele ignora é que, a maior parte das vezes, muito possivelmente, a luz que faz incidir sobre determinado objecto cria novas sombras.
17 de abril de 2009
imagina
estavas ao computador, a escrever um texto já avançado, suficientemente importante para ti. no 8.º andar onde moras, onde estarias nesse momento, avistavas da janela, devido a um enorme ruído que te despertara a atenção, uma enorme onda, duas vezes o teu prédio, varrendo, do rio, a cidade, vindo na tua direcção. o que fazias?
fazia Save
8 de abril de 2009
É um jogo
Sinto que fica sempre algo por escrever.
Ao deitar
Não me dou conta de adormecer
E esqueço logo.
Ao acordar
Levanto-me de novo e de novo jogo.
Sou de facto o Diabo
«Sou, por mister, Mestre da Magia, não sei contudo o que ela é.»
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
2 de abril de 2009
Como te desejo.
Por seres assim em tanto. E eu desejo sempre demais. Na ondulação leve do mar... Nas tuas ancas balanceia todo o querer da vida, e tudo em mim oscila a acompanhar. O modo como correm ligeiras tuas pernas sobre o areal da praia ao sol como tu. Tudo... Quero o redondo que em tudo vinga. A redondez é o escopo da vida (mesmo que a não chegue a atingir). Se a rocha é sem arestas, foi porque a redondez da onda a arredondou. Quero a onda curva que circula, e o sol circular, e o céu abobadado, e o circunferente horizonte. Vontade. Quero-te. Rebolar.
31 de março de 2009
23 de março de 2009
22 de março de 2009
21 de março de 2009
20 de março de 2009
― Let me walk with you, sweetheart. I don't want no good to harm you.
9 de março de 2009
Sou de facto o Diabo:
«O homem não difere do animal senão em saber que o não é. É a primeira luz, que não é mais que treva visível.»
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
Olho-te,
entrego-te aos sentidos, e vejo o amor a querer dar-se, querida entre teus ombros doces que sonho sentir-te com as mãos. Estás nos meus olhos, mesmo se te não olho. Ainda te não toquei com toque explícito, mas a minha ideia sabe já sentir-te como se. A minha ideia quer fazer-te próxima. Pensa em ti. O meu entender reconheceu-te. Quer trazer-te agora daí até aqui.
8 de março de 2009
Água das Pedras
Viu-se perante aquele ser e experimentou o azedo da ambivalência: linda, atraía-o; parva, repelia-o. O objecto do seu desejo multiplicara-lhe o desejo à dicotomia de um sim e de um não, qual haste una dividida em duas, e, como tal, deixou de o ser. Foi então que o seu não, acrescido em azia, o agarrou pela mão e o levou a tomar uma água das pedras.
A beleza é efémera. Não pode perdurar como a personalidade.
2 de março de 2009
1 de março de 2009
A Serra...
Sob céu hiemal e pagão, debaixo de chuva e gentio trovão, fiz revisitar-me animal.
Ó Serra de quando te abraçava os troncos ásperos, de quando dormia nos teus numerosos seios, de quando eras tu a tal — «para sempre» —, mais ninguém. Ah, como eu mudei e tu continuas na mesma e eu te amo na mesma por isso mesmo, mesmo não sendo tu já a tal. Ah, como tudo muda e tu continuas na mesma e eu te amo ainda quando te revisito, hoje. Mudei mas sou eu, Serra, na mesma. Mudar é acrescentar. Obrigado por guardares o que em tempos fui. Faz com que o seja ainda. Não serás nunca elemento passado, mas sempre sim presente, como eu. Estás em mim, és-me a animalidade, sua compreensiva aceitação. Mostraste-me e ensinaste-me pureza. Eu copiava-te. Era feroz como tu, como a chuva com que tanto me molhaste e rias, como o trovão com que amiúde me inflamaste e dançavas, como o vento volante. Eu era contente e não tinha medo, envolto em todo o teu desafio natural. Cantava contigo. Lobo gentio dos teus montes, percorria-te. Lambia-te a lua, tangia-te. Adormentado nos teus mantos, sonhava-te. Lembro-me, sim... do teu luar que me cobria quente. Como se fosse o sol. Foste tão querida... Não deixaste que ignorasse o que todos hoje ignoram e temem — o princípio do ser, que em ti principia.
Mas se até tu mudas, Serra, todos os anos... E mudas precisamente para tornares a ti, renovada, que é seres outra que não a de antes, ainda que assente, basilarmente, em ti mesma.
16 de fevereiro de 2009
Quando eu era puto
Quando eu era puto, o meu desejo. Andava eu ainda na primária, terceira classe talvez. O meu desejo era ir para a escola montado num leão. Lá ia eu, na minha mente, ego sobre o dorso tamanho de amarelo esbatido, agarrado àquela juba áspera e sorrindo, entrando portão dentro como uma espécie de deus ex machina... É disto, a vida humana. De coisas que satisfaçam o ego. De coisas grandes, leoninamente, que nos permitam camuflar a nossa fragilidade. Ou não precisássemos nós tanto de ter pais, amores, amigos - todos leões que nos transportam no dorso tamanho e indispensável à satisfação e segurança do frágil Eu.
Ah... como por vezes detesto precisar de vós. Como me custa e dói a razão de vos amar.
Gota Demiúrgica
Vinha a andar e. Era noite tarda. Caiu-me uma gotícula no lábio e lambi-a. O céu estava a querer chover e disse-mo, ao ouvido da boca.
13 de fevereiro de 2009
Impressão Póstuma
Estávamos os dois num dia de sol. Era de tarde e. Estávamos sentados. Entráramos num café e sentáramo-nos. Estava muita luz. Fiquei virado para a ampla janela. Do outro lado da mesa, ela, de costas para lá, de frente para mim. Antes. Antes tínhamos vindo juntos de metro, não sei, ou encontrámo-nos ali, não me recordo. E entrámos no café, sentámo-nos. Era de um amarelo pálido, a luz que se difundia profusa. Quase não me deixava vê-la. Eu estava... A luz não me deixava ver. A luz confundia-me. A luz incomodava-me. A luz queria mostrar-me qualquer coisa mais...
9 de fevereiro de 2009
Vai e emV
Trepo à tua flor
Ao sol brilhante;
Límpido o ar que te envolve
E te forma as cores:
Voltarei sempre a encontrar
O cálido toque da Vida.
(old stuff 1)
em cuecas em cima da cama alentejana. depois acendo uma vela. dizem que atenua o cheiro do cigarro. a janela está aberta. a luz do candeeiro também. o caruncho insiste em roer o tecto de madeira de manhã à noite, desde a noite até de manhã. é noite. por volta das duas da manhã (embora seja de noite). os cães latem ao longe. também estes alentejanos. depois de reparar nisto tudo, escrevi isto tudo. antes de estar em cuecas em cima da cama alentejana, fui beber uns copos, petisquei, mergulhei, traduzi, vi um recém-nascido, conversei com a sua irmã de cinco aninhos e acordei. antes de acordar, dormi. Agora: vou parar de escrever (talvez), fumar um cigarro de outro fim de outra noite (embora alentejana), e vou-me deitar. dormirei. mas antes, ainda, enquanto fumo o cigarro, leio o poema ao lado[1]. esquerdo.
06-2003
[1] Leia-se «abaixo».
31 de janeiro de 2009
26 de janeiro de 2009
PROJECÇÃO: ESTUPIDEZ
Eles viram-se. Já não se viam há anos. E correram um para o outro a gritar Aaaaaah e saltaram e abraçaram-se. Abraçaram-se fortemente, em várias investidas até, na tentativa de se abraçarem melhor, isto é, com mais força. E à medida que o faziam iam dando pequenas pancadas com os braços nas costas um do outro, ainda na insistente tentativa de recuperação de abraço após abraço, ao mesmo tempo que ganiam no cio do reencontro. E as pancadinhas passaram a pancadas, aumentando-lhes sempre mais a potência, pelo que passaram a grandes pancadas, fortes, fortes! — e eram já murros. Murríssimos! Matavam-se, matavam-se naquele abraço ébrio, no apreço estúpido de quando se é estúpido. Um já lhe ia aos rins, murros nos rins do amigo, enquanto o outro lhe dava amplexos brutos na cabeça e socos no pescoço. Surgiram murros no estômago. Fodiam-se todos um ao outro mas sem nunca serem infiéis ao abraço que davam. Joelhadas. Murro nos queixos: um bocado de língua voa até à gravilha que libertava um pó esbranquiçado ao sabor da violenta amizade que se estava descomprimidamente a processar. Entretanto, na bulha completa, ambos sacam de uma faca afiada e espetam-na cada um no pescoço do outro, ao mesmo tempo. Largam-se e agarram-se à lesa novidade. Caem. E morrem. Felizes de morrer.
Depois o pó assentou.
24 de janeiro de 2009
Da Amizade
tu és esta terra toda
e circular,
em que eu ando e caminho,
em que eu me deito,
em que eu vivo e existo.
és como a extensão de mim.
como o Céu o é da Terra,
o Universo o é da Vida
e Deus o é do Homem.
do mesmo modo que
eu
o sou
de ti.
ser
sou só o que sou e o que vou sendo. nunca um fim. quando eu morrer, hei-de continuar, noutras mentes, entre outros átomos.
22 de janeiro de 2009
Sou de facto o Diabo
«As minha melhores criações ― o luar e a ironia.»
«Não são coisas muito parecidas...»
«Não, porque eu não sou parecido comigo mesmo. Esse vício é a minha virtude. É por isso que sou o Diabo.»
«Não são coisas muito parecidas...»
«Não, porque eu não sou parecido comigo mesmo. Esse vício é a minha virtude. É por isso que sou o Diabo.»
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
21 de janeiro de 2009
19 de janeiro de 2009
Da dor como processo para o Melhoramento
A dor sobe do estômago de volta à boca. Rumino-a demoradamente. Amo-te. Palavra precisa e boa. Preciso. Onde estão os dias dionisíacos que a imaginação tanto parece prometer? Poderia dizer É irónica. Mas, na verdade, ironia é haver realidade. Rumino-a impacientemente. E tu nem me ouves. Amo-te. Porque é ainda em silêncio que to digo.
Não tardará: hei-de abrir a voz e o alívio.
16 de janeiro de 2009
?
Sinto-me cansado e concluo
que só pode dever-se a uma coisa:
ao peso dos óculos sobre as orelhas e a cana do nariz.
3 de janeiro de 2009
Sou de facto o Diabo
«Dato do princípio do mundo, e desde então tenho sido sempre um ironista. Ora, como deve saber, todos os ironistas são inofensivos, excepto se querem usar da ironia para insinuar qualquer verdade. Ora eu nunca pretendi dizer a verdade a ninguém ― em parte porque de nada serve, e em parte porque a não conheço. Meu irmão mais velho, Deus todo poderoso, creio que também a não sabe. Isso, porém, são questões de família.»
F. Pessoa, A Hora do Diabo, Assírio & Alvim
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