16 de fevereiro de 2009

Quando eu era puto


Quando eu era puto, o meu desejo. Andava eu ainda na primária, terceira classe talvez. O meu desejo era ir para a escola montado num leão. Lá ia eu, na minha mente, ego sobre o dorso tamanho de amarelo esbatido, agarrado àquela juba áspera e sorrindo, entrando portão dentro como uma espécie de deus ex machina... É disto, a vida humana. De coisas que satisfaçam o ego. De coisas grandes, leoninamente, que nos permitam camuflar a nossa fragilidade. Ou não precisássemos nós tanto de ter pais, amores, amigos - todos leões que nos transportam no dorso tamanho e indispensável à satisfação e segurança do frágil Eu.
Ah... como por vezes detesto precisar de vós. Como me custa e dói a razão de vos amar.

Gota Demiúrgica


Vinha a andar e. Era noite tarda. Caiu-me uma gotícula no lábio e lambi-a. O céu estava a querer chover e disse-mo, ao ouvido da boca.

13 de fevereiro de 2009

Impressão Póstuma


Estávamos os dois num dia de sol. Era de tarde e. Estávamos sentados. Entráramos num café e sentáramo-nos. Estava muita luz. Fiquei virado para a ampla janela. Do outro lado da mesa, ela, de costas para lá, de frente para mim. Antes. Antes tínhamos vindo juntos de metro, não sei, ou encontrámo-nos ali, não me recordo. E entrámos no café, sentámo-nos. Era de um amarelo pálido, a luz que se difundia profusa. Quase não me deixava vê-la. Eu estava... A luz não me deixava ver. A luz confundia-me. A luz incomodava-me. A luz queria mostrar-me qualquer coisa mais...

9 de fevereiro de 2009

Vai e emV


Trepo à tua flor
Ao sol brilhante;
Límpido o ar que te envolve
E te forma as cores:
Voltarei sempre a encontrar
O cálido toque da Vida.

(old stuff 1)

em cuecas em cima da cama alentejana. depois acendo uma vela. dizem que atenua o cheiro do cigarro. a janela está aberta. a luz do candeeiro também. o caruncho insiste em roer o tecto de madeira de manhã à noite, desde a noite até de manhã. é noite. por volta das duas da manhã (embora seja de noite). os cães latem ao longe. também estes alentejanos. depois de reparar nisto tudo, escrevi isto tudo. antes de estar em cuecas em cima da cama alentejana, fui beber uns copos, petisquei, mergulhei, traduzi, vi um recém-nascido, conversei com a sua irmã de cinco aninhos e acordei. antes de acordar, dormi. Agora: vou parar de escrever (talvez), fumar um cigarro de outro fim de outra noite (embora alentejana), e vou-me deitar. dormirei. mas antes, ainda, enquanto fumo o cigarro, leio o poema ao lado[1]. esquerdo.
06-2003
[1] Leia-se «abaixo».